Fui luz até me transformarem numa sombra esbatida, disforme e negra. Tão negra que se destacava na escuridão de uma noite de Inverno, em que as nuvens escuras escondiam o brilho da Lua.
Deixei de sentir. Tornei-me invisível e nem o meu reflexo era visível num espelho. Existia numa dimensão vazia de pessoas, despojada de Almas.
Fui eu quem deu o nome à solidão. A minha maior criação e também o meu túmulo, construído de mármore negro e frio.
Não que eu sentisse frio ou calor, mas porque a Solidão apaga todos os sentidos e alimenta-nos apenas de vazio e dá-nos ácido para saciarmos a sede.
Não se consegue fugir dela e acabamos por abraçá-la como nossa companheira.
Sou o retrato de algo que um dia existiu e que se extinguiu porque era mais fácil ser sombra e viver na escuridão, do que correr para a luz, porque o cansaço era a única coisa que eu conseguia sentir.
Desisti, porque desistir era mais barato e nos meus bolsos já só tinha uma moeda. Comprei com ela a mais negra das sombras.
Um dia encontrei um raio de luz na escuridão onde vivia. Segui-o e levou-me até ti. De repente a tua luz iluminou a escuridão onde eu me escondia e voltei a ser um rosto no espelho. A Solidão foi abafada pela esperança e pela beleza do teu sorriso. Agarraste na minha mão, disseste-me ao ouvido para não ter medo e mostraste-me que a magia de um olhar, que o toque suave das tuas as mãos, eram a porta que levava a sair das trevas e a entrar num mundo em que a suavidade das suas cores me iria divorciar da solidão e trocá-la pela brisa suave de uma manhã de primavera. Não existe nada mais belo do que nos pegarem na nossa mãos e salvar-nos da descrença.
Obrigado por teres reparado numa sombra perdida e teres-lhe devolvido a Alma.