Queres que te conte um segredo?
Já saltei de uma ponte. Fi-lo em consciência, mas de olhos vendados.
Se tive medo?
Muito.
Não como se estivesse a ser empurrado, mas por receio de não ter
coragem.
Se me estatelei lá em baixo?
Fiquei em pedaços, desconstruido, completamente desfragmentado.
Desmontei-me para voltar a ser reconstruído; mas agora livre de lacunas do
passado e do presente que me haviam secado, mumificado.
Porque vendei os olhos?
Porque queria começar de olhos fechados, sem olhar para o abismo e ter a
certeza que não me acobardaria durante a queda.
O que havia lá em baixo?
Tudo aquilo que não havia em cima da ponte. Esperança, vontade e
sobretudo o desconhecido que me poderia salvar de uma morte que já era a
minha.
Se não havia outra forma?
Se não havia outra forma?
Existem sempre alternativas, mas por vezes temos de seguir o instinto,
superar o medo e arriscar da forma mais extrema. Já te disse que o fiz
em consciência ?
O que mudou deste que saltei?
Tudo. Comecei a respirar, recuperei a minha essência, comecei a sentir,
deixei de odiar o Futuro e a conhecer as minhas imperfeições.
Se continuo imperfeito?
Sempre o fui, mas antes de saltar não tinha noção e agora conheço em mim
cada uma dessas imperfeições o que me permite não só lidar com elas,
como tentar diariamente corrigi-las?
Se consigo corrigi-las?
Consigo, com ritmos diferentes, umas já as enterrei, outras ainda me
assombram e me exigem que me esforce ainda mais.
Se sou Feliz ?
Desde que me atirei sem reservas para o abismo que tenho tido imensos
momentos de Felicidade.
Se Voltaria a saltar da ponte?
Se Voltaria a saltar da ponte?
Voltarei se me voltar a corromper ..
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